O impacto do aquecimento global está atingindo com força desproporcional as pessoas acima de 65 anos, alerta um relatório anual publicado pela revista médica britânica The Lancet. O documento, produzido por 122 cientistas de 57 instituições, analisa os efeitos das mudanças climáticas sobre a saúde global, considerando cerca de 50 indicadores. Entre as conclusões, destaca-se o alarmante aumento de 167% na mortalidade de idosos devido ao calor extremo desde a década de 1990.
Esse aumento, segundo os cientistas, está diretamente relacionado ao aquecimento global provocado pelas emissões de gases do efeito estufa. Sem a influência das mudanças climáticas, a taxa de mortalidade entre os idosos devido ao calor teria subido 65% no mesmo período. "Estamos diante de uma crise que vai muito além de questões ambientais; trata-se de uma ameaça direta à saúde e à vida das populações mais vulneráveis", afirma a pesquisadora britânica Emily Roberts, uma das autoras do relatório.
Vulnerabilidade dos idosos
O relatório aponta que os idosos são particularmente suscetíveis aos efeitos do calor extremo por diversos fatores. O envelhecimento do corpo humano reduz a capacidade de regular a temperatura corporal, o que aumenta o risco de desidratação, insolação e outras complicações. Além disso, condições pré-existentes, como doenças cardiovasculares e respiratórias, tornam essa população ainda mais vulnerável.
A médica geriatra brasileira Ana Paula Almeida explica que ondas de calor extremo podem ser fatais, especialmente para idosos que vivem sozinhos ou em áreas com infraestrutura insuficiente para enfrentar altas temperaturas. "O calor intenso sobrecarrega o organismo, especialmente em pessoas com saúde fragilizada. Muitos idosos não percebem a gravidade da situação até que seja tarde demais", alerta.
Impactos amplos e prolongados
Os efeitos do aquecimento global na saúde não se limitam às temperaturas extremas. O relatório também destaca que secas prolongadas, inundações e até mesmo perdas econômicas decorrentes da crise climática impactam diretamente a qualidade de vida da população idosa. Esses eventos podem limitar o acesso a alimentos, água potável e medicamentos, além de aumentar o estresse psicológico.
Segundo o estudo, a exposição prolongada a altas temperaturas também agrava problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão, especialmente entre aqueles que já enfrentam isolamento social. "A crise climática é uma ameaça silenciosa que amplifica desigualdades existentes, afetando os mais frágeis de forma devastadora", aponta o sociólogo e coautor do relatório, Richard Evans.
Ações urgentes são necessárias
Para mitigar os efeitos do aquecimento global, os especialistas do The Lancet defendem medidas urgentes, como a redução das emissões de gases de efeito estufa, a ampliação de políticas públicas de adaptação climática e o fortalecimento dos sistemas de saúde. Investir em infraestrutura adaptada ao calor extremo, como sistemas de refrigeração acessíveis, e em campanhas de conscientização para populações vulneráveis são alguns passos recomendados.
O relatório também chama atenção para a necessidade de um planejamento específico para atender a população idosa. "Precisamos de políticas que combinem ações climáticas e saúde pública, com foco nos grupos mais vulneráveis, especialmente os idosos", afirma Roberts.
O futuro sob ameaça
Embora o aumento das temperaturas seja inevitável a curto prazo, os especialistas alertam que as escolhas feitas hoje podem determinar o impacto que as próximas gerações enfrentarão. Para Ana Paula Almeida, a preparação é fundamental: "Proteger nossos idosos é um dever moral. Eles são os que mais sofreram as consequências do passado e, ironicamente, os mais expostos aos desafios do futuro."
O relatório do The Lancet é mais um alerta de que o aquecimento global não é uma ameaça distante, mas uma realidade que já está transformando vidas, especialmente as mais vulneráveis. Sem ações rápidas e efetivas, o impacto sobre a saúde, a qualidade de vida e a sobrevivência dos idosos tende a se agravar ainda mais nas próximas décadas.
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